Entrevista com Glauco Reis por Celeida Laporta

Essa entrevista foi realizada originalmente em português no dia 15 de junho de 2024.

Glauco Reis é mestre em Engenharia Elétrica, com concentração em Inteligência Artificial e Teoria dos Fractais, Bacharel em Matemática e Cientista da Computação, e trabalha com TI desde 1987. Atuou por mais de 20 anos com desenvolvimento em arquitetura orientada para Objetos, é especialista em Integração, modernização de aplicações e Microsserviços. Especialista Sênior do time de Client Engineering na IBM, embaixador IBM para assuntos de Quantum Computing e Certificado em desenvolvimento para Quantum Computing usando Qiskit.

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Celeida Laporta: Como a computação quântica afetará a governança da Inteligência Artificial?

Glauco Reis: Os computadores quânticos utilizam princípios de processamento estatísticos. Os QUBITs (Bits Quanticos), ao contrário dos BITS, que mantém um valor preciso 0 ou 1, possuem probabilidades de armazenamento para os valores 0 ou 1. Isto é adequado para processamentos e treinamentos de redes neurais, que se utilizam de pesos sinápticos que também são estatísticos. Quando os computadores quânticos se aperfeiçoarem no tratamento de erros, será possível reduzir os tempos de geração de modelos, que hoje levam anos mesmo se utilizando GPUs (Unidades de processamento gráfico), para semanas ou dias. Os custos de treinamentos de IAs generativas se reduzirá drasticamente, e novos experimentos poderão ser conduzidos, evoluindo todo o ecossistema. A governança será muito beneficiada, pois as esteiras de desenvolvimento terão seus tempos muito reduzidos com a inserção dos computadores quânticos no treinamento.

 Celeida Laporta: Quais são os desafios éticos e regulatórios específicos quando combinamos IA e computação quântica?

Glauco Reis: Estamos discutindo hoje muito sobre questões éticas e regulatórias, e como o treinamento das IAs (principalmente redes neurais) é dependente dos insumos, um cuidado adicional deve ser considerado na escolha das informações. É muito importante que este controle de “vieses” sejam parte da governança e uma constante preocupação. Os desafios éticos vão além, pois o uso de dados curados e com o devido consentimento dos provedores de informação também é parte dos desafios regulatórios. Aqui, novamente, a aceleração no treinamento irá permitir que experimentações sejam feitas mais rapidamente, e novos conteúdos de treinamento seja experimentados em busca do máximo de eliminação de vieses em um tempo bem menor. Devemos esperar que os resultados das IAs em um futuro próximo sejam muito melhores do que os atuais, com menos vieses, pois os tempos de treinamento também permitirão outras experimentações que hoje consomem muito tempo, e muitas vezes se tornam impraticáveis devido aos custos.

Celeida Laporta: Quais são os riscos de segurança cibernética associados à convergência dessas tecnologias?

Glauco Reis: A segurança cibernética é uma preocupação recorrente, qualquer que seja a tecnologia do processamento. No caso dos computadores quânticos, existem dois aspectos interessantes. O primeiro é positivo, pois os hackers têm muito pouco conhecimento sobre estas tecnologias, e ainda levará um tempo até que encontrem mecanismos assertivos de invasão. Por outro lado, como os computadores quânticos se baseiam em mecanismos da física completamente novos, será possível que outros mecanismos de invasão sejam criados, baseados nestes mesmos princípios físicos. Isto exigirá também que novas formas de proteção sejam criadas. Como todo novo paradigma, irá abrir novas possibilidades tanto de evolução quanto de novos mecanismos de invasão, que deverão ser mitigados quando surgirem.

Celeida Laporta: Como podemos garantir que os algoritmos quânticos sejam transparentes, justos e responsáveis?

Glauco Reis: É esperado que, assim como aconteceu com os algoritmos da computação tradicional ao longo dos anos, que estes novos algoritmos caiam em domínio público e sejam disponibilizados de forma livre. Naturalmente o perfeito balanceamento entre os interesses industriais e a academia será um processo que irá maturando ao longo da evolução da tecnologia, e acabará sendo adicionada a nosso quotidiano de forma evolutiva. Organismos de controle deverão existir, como já existem hoje na computação tradicional. Os desafios serão os mesmos que temos hoje, mas inegavelmente e historicamente os benefícios trazidos pela computação, em todos os segmentos do conhecimento humano, superam em muito os malefícios causados pelas novas formas de comunicação e acesso à informação. Esperamos que de forma similar a computação quântica revolucione de novas formas, e este benefício será muitas vezes maior do que eventuais malefícios trazidos pela tecnologia.

 Celeida Laporta: Quais são os impactos ambientais da computação quântica e como podemos mitigá-los?

Glauco Reis: Os computadores quânticos utilizam princípios da mecânica quântica, e a maioria de suas instruções são reversíveis, o que teoricamente proporciona melhor economia de energia, pois ela deverá se perder menos energia durante o processamento. Ainda muito precisa ser evoluído até que tenhamos computadores que possam operar em temperaturas mais próximas do ambiente, mas ao que tudo indica, pela natureza da execução dos computadores quânticos, será possível um melhor balanceamento entre a performance e os gastos energéticos. Este segmento é uma das áreas de estudo atuais da computação quântica e esperamos considerável vantagem em relação aos mecanismos atuais.